domingo, 20 de maio de 2012

Despentes e o feminismo pró-sexo


Violação, prostituição e pornografia. São os três vectores principais deste ensaio, que nos propõe uma teoria revolucionária quanto ao modo de olhar a sexualidade.

Há que primeiro conhecer a autora. Virginie Despentes nasceu em Nancy, durante uma adolescência rebelde e conturbada, os pais chegaram mesmo, à laia de desespero, a enfiá-la num asilo psiquiátrico. Terminado o liceu, mudou-se para Lyon, onde exerceu todo o tipo de actividades: caixeira de supermercado, mulher a dias, crítica de filmes pornográficos e até mesmo prostituta.
O seu primeiro livro – Baise-moi (Fode-me) – foi tão bem sucedido quanto controverso, já que se tratava da mais pura afronta social. Seguiram-se outros livros, filmes, prémios. Neste momento, Despentes é uma das mais aclamadas autoras francesas.

O que é o feminismo pró-sexo? Nascida nos anos oitenta nos Estados Unidos, é uma teoria que defende que a mulher deve poder utilizar o seu corpo e vendê-lo se bem lhe apetecer. Olha para a criminalização da prostituição como apenas mais um factor de marginalização das populações desfavorecidas e um meio de reconfortar o ideal judaico-cristão de família tradicional que nos foi, basicamente, imposto.
Segundo a autora, representar o conjunto das trabalhadoras do sexo através da, por exemplo, escravatura humana das máfias de Leste, é tão redutor como falar dos trabalhadores têxteis mostrando crianças na Índia metidas em caves.
Falemos de uma mulher cuja principal função de vida não é agradar ao homem, o que, hoje em dia, ainda nem sempre é verdade. E portanto: “Nem sempre é evidente a distinção entre a prostituição e o trabalho assalariado legal, entre a prostituição e a sedução feminina, entre o sexo tarifado e o sexo interesseiro, entre aquilo que conheci durante aqueles anos < de prostituição > e os anos seguintes < como escritora de sucesso >. O que as mulheres fazem com o seu corpo, a partir do momento em que à volta delas há homens com poder e dinheiro, parece-me, bem vistas as coisas, muito parecido. Entre a feminilidade vendida nas revistas e feminilidade da puta, a nuance escapa-me completamente. E, embora não exponham claramente os seus tarifários, tenho a impressão de ter vindo a conhecer muitas putas nos últimos tempos. ”
E continua: “Tal como o trabalho doméstico e a educação das crianças, o serviço sexual feminino deve permanecer caridoso. Dinheiro igual a independência. O que consiste um atentado moral no sexo tarifado não é o facto da mulher não sentir prazer, mas que ela se afaste do lar e ganhe o seu próprio dinheiro. A prostituta é a “atacante”, aquela que se apropria da cidade. Trabalha fora do doméstico e da maternidade, fora da vida familiar. Os homens não precisam de lhe mentir nem de a enganar, assim, ela arrisca-se perigosamente a tornar-se na sua cúmplice.”

Relativamente à violação e à pornografia, Despentes também encontra coisas interessantes a dizer, das quais penso falar posteriormente.
É fascinante ler a autora, embora este livro em particular não tenha sido publicado em Portugal (mas pode-se encontrá-lo em francês, espanhol, inglês e português do Brasil), o último - Apocalipse Baby -  foi.
Falamos, cada vez mais, numa revolução que se propõe pôr em causa a própria distinção de géneros. 



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